Passear com Gabriel foi a maneira que a catarinense encontrou para acalmar e alegrar o filho, diagnosticado com um quadro de autismo severo
Todos os dias, uma mãe pedala mais de 5 horas em sua bicicleta para entreter e acalmar o filho, que é autista não-verbal. Desde pequeno, o garoto de 10 anos acompanha a mãe naquilo que é seu hobbie preferido: passear pelas ruas de Garuva (SC), sentindo a brisa bater em seu rosto.
Se antes Gabriel partia numa aventura com Suellen na cadeirinha da frente da bicicleta, hoje, precisa levantar um pouco as pernas para as sandálias não se arrastarem no asfalto.
Faça chuva ou faça Sol, nublado ou ensolarado, Suellen Cristina Budenetz, 29 anos, sai de casa às 13h30 e pedala com o filho até às 16h. Eles voltam para casa, tomam um lanche, pegam a bike e saem de novo, para mais duas horas e meia de passeio, de segunda a segunda.
Passear com Gabriel foi a maneira que a catarinense encontrou para acalmar e alegrar o filho, diagnosticado com um quadro de autismo severo.
“Ele é apaixonado por bicicletas, o brinquedo dele é um pedaço de bicicleta velha que costuma girar os pedais e ver o movimento da roda”, revela a mãe, cuja aura se resplandece ao ver o sorriso do filho quando é convidado para subir na garupa.
O amor de Gabriel se estende também aos ônibus, principalmente os escolares, de cor amarela. Suellen decorou os horários que eles deixam as escolas e em quais ruas eles passam, só pro filho poder vê-los. “Quando os ônibus escolares vão embora, recorro à rodoviária”, conta, sorrindo.
A estrada percorrida por Suellen tem sido tortuosa, mas muito recompensadora. Ela lembra que no sexto mês de gestação descobriu que o filho tinha hidrocefalia (dilatação da cabeça nos bebês). “Foi um susto atrás do outro, não sabia o que isso poderia significar na vida dele”, conta a mãe, que chegou a ouvir dos médicos que seu filho não falaria, não andaria e poderia viver, para sempre, em estado vegetativo.
Um aborto foi sugerido pela equipe médica, mas a catarinense negou. Ao nascer, Gabriel ficou internado na UTI durante três semanas, e outros 45 dias para a realização de inúmeros exames. “Entrava na maternidade chorando, em todos os dias que fui visitar meu filho. Nunca houve boas notícias no início de sua vida”, lembra.
Guerreira que só ela, Suellen deixou a maternidade com o filho nos braços, confiante de que a partir daquele momento, cada pequeno obstáculo superado por Gabriel seria comemorado com júbilo por ela.
Quando completou dois anos, após um longo período de fisioterapia, o menino começou a andar, algo que a mãe conta que levará para sempre em suas lembranças. Outra memória que ficará marcada para sempre foi quando ele disse a primeira e única palavra até hoje, aos seis anos de idade: ‘Mama’.
“Ele me chamou de ‘mama’ e eu me emocionei na hora, foi inesperado. Pedi para ele repetir, mas ele não repetiu. Só depois de um tempo… É a única palavra que ele fala, mas é tudo pra mim”, conta, Suellen.
Aos seis anos, matriculado na APAE de Garuva, Gabriel foi diagnosticado com autismo severo. Desde então, é medicado diariamente. Este passou a ser um novo e desconhecido caminho que ela deveria percorrer, conhecendo, diariamente, os desafios de ser mãe de uma criança autista, à medida que o filho crescia. E ele cresceu! Para suspiros aliviados da mulher que tem como único medo de sua vida o risco de perdê-lo.
Mais recentemente, Suellen tem repensado sua postura como mãe, analisando os ‘mimos’ que ainda dá ao filho único. “Acho que exagerei um pouco, mas meu marido, pai de Gabriel, está ensinando-o a ter noções de limite”, afirma a mãe que se esforça para orientar seu filho para os desafios do mundo, principalmente, quando Gabriel não terá mais ela para guiá-lo, nem na bicicleta, nem na continuidade da vida.
Chegará o dia que Gabriel pedalará sozinho, uma certeza que aflige Suellen. “Só a mãe tem paciência. Paciência para fazer comer… Tem dias que preciso insistir para que ele coma direitinho. Faço isso pelo amor de mãe que sinto por ele, sou perseverante. Sei que, dificilmente, outro fará.”
Ainda há muito chão para pedalar. Por vezes, a bicicleta estraga. Em outras, o vento a derruba. Respinga lama, bate o cansaço… Mas mãe e filho são imbatíveis, inseparáveis. Com muita simplicidade, eles tem a plena convicção de que, juntos, conseguirão superar todas as adversidades que a vida ainda tem a oferecer.
Fonte: Folha Norte SC/Fotos: Herison Schorr
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