Na tarde da última sexta-feira um homem em situação de rua entrou na imobiliária de Ana Paula de Melo, em Indaial. “Ele pediu comida e algum dinheiro”, conta. Ana providenciou a alimentação ao senhor de 58 anos e resolveu puxar conversa. Segundo a empresária, “ele contou que estava na rua há quase dois meses e que estava à procura da família que não via há mais de vinte anos. Vi ali que podia ajudar”.
Ana pediu autorização para fotografar o senhor. Ela enviou a foto à redação do Misturebas News e, dada a urgência, o editor-chefe Fábio Ferrari se apressou em publicar. “Vinte minutos depois, já recebi mensagem da família”, conta Fábio.
Agora, precisávamos encontrar o senhor que vivia nas ruas para dar a boa notícia.
A busca
Montamos duas frentes: Ana e outra corretora, Patrícia, percorreram os pontos que ele disse que frequentava. Foram até a Casa Acolhida, da Igreja Matriz, que oferece três refeições por dia a quem não pode pagar pela comida.
Enquanto isso, Fábio e eu fomos buscar informações em uma casa abandonada usada por pessoas em situação de rua. Mostramos a foto a dois homens que viviam ali, em meio ao lixo, e logo o senhor foi reconhecido, mas ninguém sabia onde estava.
Nossa melhor chance era esperar anoitecer.
“Eu tinha combinado de entregar um casaco, ele me disse que estava dormindo debaixo de uma marquise na Travessa Santos, no bairro das Nações”, afirmou Ana.
O encontro
Foi só anoitecer e o senhor magro, de aparência frágil, apareceu. Fazia muito frio naquela noite. Ele colocou o casaco de Ana, se cobriu e contou um pouco de sua história.
O homem pediu para não ser identificado. Existe um sentimento de vergonha muito presente em pessoas que estão no extremo da vulnerabilidade. Ele contou que vivia em outro estado e que o término de um longo casamento foi o motivo que o levou às ruas.
O rompimento de laços familiares é a principal causa da situação de rua em todo o País, apontada por 44% das pessoas que não têm um teto para viver*. É importante destacar também que o que caracteriza a situação de rua é a extrema pobreza. Pode até acontecer, mas pessoas que têm condições financeiras dificilmente acabam dormindo em calçadas, abrigos e embaixo de viadutos.
Na rua, o senhor contou que passou frio, fome e medo.
“Nos finais de semana a igreja não abre e a gente fica sem ter o que comer. Eu ficava mudando de local porque tenho minha mochila, com meus documentos e sempre tive medo de ser roubado”, contou.
Sobre o encontro com Ana, ele destacou: “as pessoas desviam o olhar quando percebem que você é uma pessoa que vive na rua. Ela não. Ela me olhou e não desviou o olhar e se importou de verdade comigo”, disse ao Misturebas News. O sentimento de inexistência é marcante entre quem está em situação de rua.
Ana e eu demos a boa notícia ao homem, de que ele não precisaria passar mais uma noite na calçada. Foi no carro do Misturebas News que o senhor de saúde frágil foi levado ao reencontro com um familiar.
Um longo abraço, lágrimas e poucas palavras foram o possível naquele momento tão intenso.
Não vamos romantizar a situação. Claro que algum problema de readaptação ou a própria condição financeira podem colocar este senhor de volta para as ruas. Nós, do Misturebas News, vamos acompanhar o caso. E, por enquanto, ficamos com a esperança e com a atitude de Ana, que escolheu se importar e ouvir. E isso fez toda a diferença.
*Os dados são do CadÚnico, cadastro obrigatório para pessoas que recebem benefícios sociais. O sistema de bases foi criado pelo governo federal, mas é operado pelas prefeituras de todo o País.
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