INDAIAL – A obra que teve início no dia 9 de janeiro na rodovia Augusto Hasse, em frente ao Fort Atacadista, em Indaial, promete dar fim a três décadas de alagamentos na pista para tranquilidade dos motoristas de Indaial e Timbó. Mas, mesmo que dê tudo certo, existe uma família que não tem motivos para comemorar, a família de seu Aquiles, de 75 anos, e de dona Dorlia, de 76, talvez a mais importante dessa história toda.
Uma família para a qual a tão esperada obra já gerou tanta dor e sofrimento que nenhum concreto é capaz de trazer alegria. Quando o trecho da SC477 não alagar mais, todo mundo vai esquecer os transtornos que passou, menos o casal de aposentados e suas duas filhas, que tiveram a vida radicalmente mudada por toda a discussão em torno da obra.
Este texto não pretende contar a história da obra, que já foi amplamente discutida. Então, peço desculpas ao leitor que quer saber detalhes sobre o imbróglio. Este texto não é sobre uma obra. Não é sobre mobilidade urbana e progresso. Este texto é sobre uma família e o martírio enfrentado por ela, que inclui a alegação de que nunca foram ouvidos de verdade.
Primeiro, é importante destacar que os motoristas reclamam com razão, mas a família de seu Aquiles – que também dirige – é a que mais enfrenta transtornos com o excesso de água na pista. O alagamento, para eles, é literalmente na porta de casa, não tem como desviar. Foram incontáveis as vezes em que as crianças – netos do casal – não conseguiram ir para a escola. Mas isso é o de menos.
O assunto causa tanta dor que ninguém da casa consegue falar dele sem encher os olhos de lágrimas com uma mistura de raiva, sensação de injustiça e tristeza. Principalmente, pelos dois idosos que depositaram naquele pedaço de chão todos os seus sonhos e fizeram ali a sua história.
A mudança veio quando se casaram, há 49 anos. Ergueram a casa do nada com dona Dorlia pegando no pé dos pedreiros e ajudando a colocar os tijolos. Morar em uma casa que você ajudou a construir tem um valor sentimental que não é possível medir.
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O terreno da casa é enorme (12 mil metros quadrados) e por ele passa uma nascente, um verdadeiro tesouro no meio do vai-e-vem urbano de caminhões, motos e carros. Ali, as crianças brincam sem saber ainda quanta dor os avós enfrentam. O fato é que o casal responde por diversos processos judiciais.
Mas no tribunal da internet, eles já foram julgados e condenados por não deixarem que as obras de revitalização atravessassem o terreno.
Seu Aquiles foi acusado de sorrir na varanda enquanto os motoristas sofriam. As críticas – inclusive de parentes – de quem acha que está tudo bem ofender através das redes sociais causaram estragos irreparáveis.
Nos momentos mais tensos, dona Dorlia chorava ao ouvir barulho de retroescavadeira, imaginando que chegara a hora em que a casa seria demolida, a casa que ela ajudou a erguer.
Trinta dos setenta anos do casal foram vividos assim, sendo tratados como inimigos da sociedade. A saúde também foi afetada. Seu Aquiles teve um AVC que a família atribui ao estresse.
Não está escrito de forma expressa na Constituição, mas existe consenso jurídico sobre a supremacia do interesse público sobre o privado. Este texto não defende que um lado ou outro está com a razão.
Este texto defende que todos têm o direito de serem ouvidos e de terem suas histórias contadas.
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